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domingo, 1 de maio de 2016

Da barragem de Morrinhos à Praça do Divino – a água e as árvores de cada dia


Imagem do Google. Praça do Divino e suas árvores de concreto. Há um poste no meio do caminho.



Fotos da barragem de Morrinhos circulam em celulares e nas redes sociais e dão conta de que o nível está muito abaixo do normal. As pessoas fazem oração pedindo chuva, embora o período seja de estiagem mesmo. Vão ter que esperar chegar outubro. Comentários que circulam também dão conta que vão derrubar as árvores da Praça da Bandeira, as casuarinas. O local está sendo reformado para a construção de um equipamento esportivo e uma arena, além de outros itens. Mas a discussão não é sobre o equipamento em si. Ótimo para cidade que ganhará um novo local de lazer e foi conseguido após muita reivindicação de grupos. Antes que os críticos de plantão venham dizer que estou questionando a reforma da Praça, isso não é verdade. Pontuo isso para que não desvirtuem a discussão. 

Há um encadeamento de ações que está deixando a cidade quase desértica. É importante pontuar que Poções não é, dentro de sua sede, uma cidade com arborização natural. Quase todas as espécies de árvores, sejam casuarinas ou outras, foram plantadas. Não são originárias do local. Percebo isso pelas fotos tiradas antes de 1950. Contudo, a vegetação que existe, ou existia, na parte que conhecemos como zona da mata, indo para Morrinho, equilibrava o clima de Poções. Trazia o frio e a chuva nos períodos certos.

Dentro da cidade a arborização começou a ocorrer em meados da primeira metade do século 20 e isso deu ainda mais vida e embelezamento ao local. As imagens da ladeira da Igreja Matriz com aquelas árvores enormes, a praça da Bandeira muito arborizada, agregada à praça do Coreto, à praça ao lado do Colégio Isaías Alves, e até mesmo à praça do Divino, que continha poucas, mas havia algumas árvores, se esfacelaram e estão apenas em fotografias ou na memória de cada um que nasceu antes dos anos 1990. As vítimas da vez são as árvores da praça da Bandeira, pelo que me consta. Vão restar apenas as árvores da praça ao lado do Isaías Alves, da praça do posto de Puericultura e da praça Monsenhor Honorato, estas últimas duas compostas por amendoeiras, e um monte de fícus, única espécie espalhada por toda a cidade. Se as árvores da praça da Bandeira estiverem condenadas, quase mortas, não vejo problemas em substituí-las, mas ao contrário, não há necessidade alguma de tirá-las apenas por capricho, como parece que está acontecendo. As árvores em nada impedem a construção de nenhum equipamento esportivo ou outros. Os embeleza inclusive e deixa o ambiente mais agradável. 

Mas é importante salientar que é a partir dos anos 1990 que começa a haver e acelerar uma verdadeira degradação ambiental, corte de árvores de forma indiscriminada e transformação do espaço, desde a zona da mata, passando pela barragem de Morrinhos até o centro da cidade, o que tem resultado em calor desproporcional, risco de falta d’água e longos períodos de estiagem.

Barragem de Morrinhos. Foto de Joilson Júnior compartilhada no Facebook
Além dos desmatamentos próximo à Morrinhos como problema motor, inúmeros sítios foram construídos às margens da barragem. Toda sua vegetação e até mesmo sua água está tendo um impacto imensurável por causa desses sítios. A barragem está sendo apropriada em benefícios de poucos para passarem uma fim de semana de lazer nesses sítios, contaminar a água e acabar com as matas ciliares. A primeira providência, antes mesmo de oração a tantos deuses, seria um ação mais terrena: exigir que o Ministério Público peça a desapropriação de cada sítio daqueles às margens da barragem e de todos que estão sendo construídos de forma irregular próximo a ela. A cada árvores derrubada e cada sítio construído, as nascentes vão sendo afetadas e posteriormente não vai ter chuva que dê jeito, caso ainda ela caia. 

Esse encadeamento se reflete no pensamento dentro da própria cidade. A praça do Divino era um areião, onde se praticava campeonatos de futebol nos finais de semana, local da Festa e tinha algumas árvores. Em meados dos anos 1990, transformaram o local em uma quadra poliesportiva e derrubaram as árvores que restavam. Hoje, a prática esportiva é inviável. Trocaram as árvores por postes que servem apenas para utilização durante festas. Inclusive há um poste no meio da quadra. As árvores naturais foram trocadas por árvores de cimento que impedem até mesmo a prática esportiva. Isso aconteceu paulatinamente. Não foi de um dia para o outro. A praça do Divino poderia ser o cartão-postal da cidade, bem arborizada e com a Igreja do Divino e Coreto ao fundo, mas não. Ela foi transformada em uma praça para dar vida a postes. Alguns deles não estão ali nem para gerar luminosidade, o que parece curioso e até risível. Não se pode praticar esporte e muito menos respirar ar puro, no máximo podemos é escorar em uma dessas colunas para descansar. 

Fiquemos então com um sol para cada um. Água ainda há, mas não sei até quando. Frio no inverno, chuva no verão, talvez sejam apenas lembranças daqui a alguns anos. Só pra finalizar, não sou ambientalista, muito menos do Greenpeace, como fui chamado há algum tempo, mas não poderia ficar inerte a tudo isso que vejo acontecer. Quando acabarem com a barragem e o restante das árvores na mata e também na cidade, sintam à vontade para levantarem as mãos e seus rostos aos céus e começarem a orar. Só espero que Deus não esteja tão ocupado atendendo a cada Deputado Federal e político brasileiro que clama por sua intercessão. Vão ter que entrar na fila.

Um comentário:

  1. Muito bom o seu texto Agra, precisamos de pessoas que produza reflexões para a população Poçoense. Abraços e espero mais publicações.

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