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sexta-feira, 24 de julho de 2015

Quanta saudade da minha Poções

Foto retirada do site Taberna da História do Sertão Baiano. Ela está disponível também no grupo no Facebook do Velhas Fotografias de Poções. Data - provavelmente década de 1920.

Texto: Fábio Agra

O artista plástico Adilson Santos, em uma conversa comigo certa vez, relembrava seus medos, seus pesadelos de infância. Estávamos na casa de seu Fidelis Sarno (Fidelão) e ele comentava o quanto tinha medo, quando criança, de que o rio São José transbordasse e inundasse toda Poções. Adilson Santos morava próximo à margem do rio, na ladeira que fica ao lado do Escola Alexandre Porfírio, perto da antiga capelinha, um dos marcos de Poções.

Naquele pedaço de imaginação e espaço estava também a história da cidade. Os fantasmas iam e vinham, eram construídos e de repente sumiam. O tempo se prolongava durante as chuvas. Os boatos de que a cidade seria inundada se espalhavam como os pingos que caiam do céu.  

Mas, ao mesmo tempo, em seus sonhos, Adilson Santos via na inundação da cidade uma oportunidade de se deliciar com os doces e balas das vendas, que ficariam emersas e ao alcance das crianças.

Poções não foi inundada pelo São José e, provavelmente, nunca será. O rio está quase morto. As vendas praticamente já não existem. Quase não se tem crianças correndo para tentar alcançar o balcão, que tinha em suas extremidades as balas, de um lado, e um rolo de fumo, de outro. Adilson Santos deixou Poções por volta dos 13 anos de idade e ainda carrega consigo todas estas lembranças. As narra como se estivesse pensando nos traços de suas telas.

Foto: Lulu Sangiovanni/Casarão dos Schettini na Rua da Itália.
Demolido esta semana.
Estas memórias que fazem Adilson Santos ficar paralisado, pensando e viajando até o seu quintal de cinqüenta anos atrás para olhar o céu estrelado, são as do mesmo tipo que vamos carregar a partir desta semana.

O casarão dos Schettini também foi por terra, como se o rio São José tivesse transbordado, inundado a cidade e destruído todas as nossas lembranças. O coração apertou. De longe, acompanhava todos os relatos e perplexidade dos nossos conterrâneos.
Era como se a Rua da Itália e todos os seus fantasmas avistassem sua hora derradeira. Aos golpes de marreta, Poções está mutilada. Sua história e memória agora se espremem e cedem lugar ao vazio, ao nada.

As marretas que se arvoraram contra as paredes e suas marcas não colocaram no chão apenas uma casa, colocaram de joelhos uma cidade. As inundações, que tanto se temiam que viessem do rio São José, surgiram agora dos olhos marejados de sua gente.

Restam-nos as fotografias guardadas em nós mesmos e as que se transbordam em papéis. Nossa imaginação alimentará, através dos relatos, tudo o que se pensou e o que viu sobre aquele casarão, inigualável. Como vai ser difícil voltar a Poções, passar pela Rua da Itália e não ter mais que olhar para o alto.

Como deve ser difícil voltar e não temer a cidade se transbordando pelas águas do rio São José, não ouvir o som dos clarins da Lítero Musical Primavera, não correr para se sentar ao lado de sua turma na próxima sessão do cinema, não ver os dribles de João Batatinha, não ouvir o canto das casuarinas, não colher gabiraba no verão e não olhar para o céu e ver a lua despontar por detrás do casarão dos Schettini. Quanta saudade da minha Poções!

5 comentários:

  1. Parabéns Fábio , ótimo texto!! Nada como falar de algo tão sério a partir das memorias e de afetos! me lembrei da visita de Geraldo Sarno a Poções e como ele disse que imaginava que seria o seu retorno. Acho que todo o retorno tem esse temor, de mudança na cidade e de si mesmo. Escreve alguma coisa sobre a Voz do Gaivota!!

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    1. Muito obrigado por ter lido o texto. Só não consegui identificar quem escreveu o comentário. Aqui só apareceu Mi Cn. A Voz do Gaivota é outro patrimônio de Poções. Abração!

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  2. Muito tem se falando sobre a derrubada do casarão dos schittinis em poções quanto nas emissoras de rádio, nas ruas, nas redes sociais etc, o que podemos fazer para preservar o pouco que ainda nos resta? Daquela época ainda temos, o casarão de Argemiro Pinheiro na praça da Bandeira que apesar da troca de suas portas e janelas sua estrutura permanece amesma, temos o casarão dos macedos onde ioiô Macedo foi por muitos anos tabelião, depois seu filho vilobaldo, a usina de arroz que nos constantes defeito da usina de energia iluminavam as casas dos italianos, a casa dos paladinos construída por dr Rui espinheira que na decoração da parede frontal da varanda tem duas árvores maiores e cinco menores tamanhos decrescente representando os filhos do casal entre outras construções como a casa de Jambrim Gusmão na rua olímpico rolim que foi uma das primeiras a ter banheiro dentro de casa e tinha romaria para conhecer a novidade, afinal ele foi o primeiro prefeito de planalto e por aí a fora. Vamos preservar o que ainda resta?

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    1. Muito obrigado também por ter lido o texto. Realmente precisamos tomar providências para salvar o que resta. Poções tem importantes símbolos que precisam ser preservados. Abraços!

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  3. Muito tem se falando sobre a derrubada do casarão dos schittinis em poções quanto nas emissoras de rádio, nas ruas, nas redes sociais etc, o que podemos fazer para preservar o pouco que ainda nos resta? Daquela época ainda temos, o casarão de Argemiro Pinheiro na praça da Bandeira que apesar da troca de suas portas e janelas sua estrutura permanece amesma, temos o casarão dos macedos onde ioiô Macedo foi por muitos anos tabelião, depois seu filho vilobaldo, a usina de arroz que nos constantes defeito da usina de energia iluminavam as casas dos italianos, a casa dos paladinos construída por dr Rui espinheira que na decoração da parede frontal da varanda tem duas árvores maiores e cinco menores tamanhos decrescente representando os filhos do casal entre outras construções como a casa de Jambrim Gusmão na rua olímpico rolim que foi uma das primeiras a ter banheiro dentro de casa e tinha romaria para conhecer a novidade, afinal ele foi o primeiro prefeito de planalto e por aí a fora. Vamos preservar o que ainda resta?

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